Muitos séculos antes de o
primeiro autor hebreu escrever uma palavra em um manuscrito de pele de
carneiro, contadores de história preservaram a épica história dos israelitas.
Relatos da criação, Noé e o
Dilúvio, a Torre de Babel e a longa caminhada de Abrão a Canaã eram passados
oralmente de geração a geração.
Os contadores de história
talvez tenham sido as pessoas mais velhas da famílias, os líderes comunitários,
ou apenas pastores com extraordinários dons de memória e recitação.
Entre os hebreus, tinham-se
em grande conta os contadores de história, pois eles narravam não apenas a
crônica de uma nação, mas a história da relação de Deus com seu povo eleito.
Seus relatos passaram a ser
tão conhecidos que os ouvintes queriam que eles os recontassem da mesma maneira
todas as vezes.
Ninguém sabe quando as
histórias da Bíblia começaram a ser escritas. Mas Moisés é o primeiro hebreu
que a Bíblia identifica como autor.
Depois que os israelitas do
Êxodo atravessaram o mar Vermelho, rechaçaram um ataque dos amalequitas. Disse,
então o Senhor a Moisés: “Escreve isto
num livro, para servir de monumento, e faze-o ouvir a Josué”. Ex. 17.14.
Se essas palavras eram
entendidas pelos israelitas como sagradas, a Bíblia não diz, mas os textos que
se seguiram nos meses e anos posteriores certamente o eram.
Quando Moisés desceu do
monte Sinai com os Dez Mandamentos, escritos nos dois lados das duas tábuas,
trazia nas mãos “a obra de Deus, como
era a escritura, que estava gravada nelas” Êx. 32.16.
Depois, quando os israelitas
acampavam no sopé da montanha, Deus deu a Moisés um conjunto detalhado de
prescrições segundo as quais os hebreus deviam viver.
Esta lei mosaica, acha-se
enredada nas histórias do êxodo, Levítico e Números, depois resumida no Deuteronômio.
“Escreveu pois Moisés esta lei, e a entregou aos sacerdotes filhos de
Levi, que levavam a arca do concerto do Senhor, e a todos os anciãos de Israel”
Deut, 31.9.
OS
CINCO LIVROS DE MOISÉS
Segundo a tradição judaica,
Moisés escreveu os cinco primeiros livros da Bíblia, incluindo as histórias do
Gênesis, que passaram centenas de anos antes de seu nascimento.
Embora nenhum dos cinco
livros identifique seu autor, a autoria de Moisés prosseguiu incontestada até o
século XVII. Mas, mesmo nos tempos antigos, estudiosas da escritura detectaram
indícios de que Moisés talvez não tenha sido o único autor da coletânea de
cinco livros conhecida como Pentateuco.
Entre estes indícios, o mais
óbvio é que Deuteronômio termina com uma descrição da morte e enterro de
legislador.
O filósofo inglês Thomas
Hobbes, no século XVII, tornou-se o primeiro de que se tem registro a declarar
que Moises provavelmente não escreveu a maior parte dos cinco livros.
Teólogos apoiaram essa
ousada afirmação, compilando indícios que sugeriam que muitos profetas e
sacerdotes orientados por Deus tiveram participação na escrita.
Argumentaram, por exemplo,
que a repetida frase “até hoje” do
pentateuco parece uma referência óbvia a um tempo muito posterior àquele em que
ocorreram os fatos – provavelmente uma referência do período em que os hebreus
reuniram uma extensa série de fontes que se referiam a Moisés e compilaram o
que se tornou conhecido como os Cinco Livros de Moisés.
O início provável do
trabalho nestes livros – a história mais antiga dos hebreus – foi depois do
estabelecimento de Israel como nação, durante o reinado do rei Davi, que
começou cerca de 1000 a.C.
O pentateuco foi adquirindo
sua forma final, enquanto os escribas do palácio e os sacerdotes do templo
registravam a continuação da história de sua nação.
Músico escreviam salmos de
louvor e dor; estudiosos reuniam preciosas citações de sabedoria para os
jovens, profetas pregavam a Palavra de Deus. Muitas destas palavras faladas e
escritas integraram a liturgia hebraica e foram abraçadas pelas pessoas como os
textos dos hebreus: a futura Bíblia.
REDESCOBRINDO
A LEI
Como e quando essa memória e
revelação se tornaram as escrituras sagradas dos judeus continua sendo um
mistério.
Um marco histórico, contudo,
foi o dia em que um sumo sacerdote descobriu um pergaminho há muito esquecido,
durante a renovação do templo 350 anos de Salomão, em cerca de 620 a.C. o
pergaminho pode ser uma versão do Deuteronômio, um resumo das leis judaicas no
pentateuco, pois o sacerdote disse: “ Eu
achei um livro da Lei na casa do Senhor” II Rs. 22.8.
O rei Josias ordenou que o
documento fosse lido em público para todos os anciãos hebreus. Depois iniciou
uma vigorosa reforma nacional em que depôs sacerdotes pagãos e destruiu
santuários idólatras.
Um segundo marco histórico
na criação da Bíblia hebraica veio 160 anos depois, quando uma nova nação judia
começou a erguer-se das cinzas de uma terrível derrota. Retornando do exílio na
Babilônia, uma escassa comunidade de judeus congregou-se em meio às ruínas
queimadas de Jerusalém.
Ali, “Disseram a Esdras escriba que trouxesse o livro da Lei de Moisés, que o
Senhor tinha prescrito a Israel” Ne. 8.1 – os cinco livros tradicionalmente
atribuídos a Moisés – ou pelo menos partes dispersas que continham as leis
judaicas.
Os exilados de volta a
Israel tinham motivos para acreditar nas palavras: a lei mosaica adverte que,
se os israelitas desobedecessem, o Senhor enviaria invasores e “te espalhará por todos os povos desde uma
extremidade da terra até os seus fins” Deut. 28.64. Sendo assim, os
exilados de volta a Israel temiam que pudesse acontecer de novo.
Os judeus dividem sua Bíblia
em três partes: a Lei, ou Torá; os Profetas; e as Escrituras.
Estudiosos acham que os
judeus aceitaram seu cânone bíblico atual em estágios, a começar com a Lei,
logo após o trágico exílio na Babilônia.
Talvez a leitura de Esdras,
por volta de 458 a.C., tenha formalizado esse estágio inicial. Nos séculos
seguintes, o povo passou a reverenciar os oito livros dos Profetas: Josué,
Juízes, Samuel, Reis, Isaías, Jeremias, Ezequiel e os Profetas Menores reunidos
em um único rolo de pergaminho.
Por volta do ano 180 a.C., o
autor do deuteronômio de Sirac mostra que os Profetas eram vistos como
sentenciosos: fala repetidas vezes dos livros da Lei e dos Profetas, junto com
outros livros.
Por volta do ano 100d.C., os
judeus aceitaram os 11 livros das Escrituras: Salmos, Provérbios, Jó, Cântico
de Salomão, Rute, Lamentações, Eclesiastes, Ester, Daniel, Esdras-Neemias em um
único rolo de pergaminho e I e II Crônicas em um único rolo de pergaminho.
No início do primeiro século
cristão, antes de o cânone judeu ser estabelecido, Jesus descreveu as
escrituras de Israel como “tudo o que de
mim estava escrito na Lei de Moisés, e nos Profetas, e nos Salmos” Lc.
24:44, dando a entender que nem todas as Escrituras foram reconhecidas. Mas
talvez a prova mais forte de que a Bíblia hebraica evoluiu aos poucos esteja na
Septuaginta, a antiga tradução grega das escrituras hebraicas, que deve seu
nome aos 70 eruditos judeus que, em meados de 200a.C., traduziram o Pentateuco
para o grego.
Ao longo dos dois séculos
seguintes, outros livros dos judeus foram paulatinamente acrescentados até a
Septuaginta incluir todo o Antigo Testamento atual – e mais. Os outros livros,
escritos entre 300 a.C., e 70 d.C., passaram depois a ser conhecidos como
Apócrifos.
POVO
DO LIVRO
Quando Roma esmagou a
revolta dos hebreus em 70 d.C., destruindo Jerusalém e o templo, exterminou o
sistema sacrificial no qual se construiu a fé judaica. Sem o templo – que
jamais foi reconstruído – não poderia haver sacrifícios nem sacerdócio. Os
judeus voltaram-se para suas escrituras e tornaram-se um povo do Livro, e este
livro é a Bíblia hebraica.
Havia um problema: o Livro
tinha muitos textos contestados e muitas versões. Assim, os judeus resolveram
estabelecer quais textos e versões eram autorizados e se decidiram por 24
livros. (Os cristãos mais tarde dividiram esses mesmo 24 livros em 39,
separando os livros de Samuel, Reis, Esdras-Neemias e Crônica em dois cada, e
os doze Profetas Menores).
O exemplar mais antigo da
Bíblia hebraica é o Códice de Leningrado de 1008, copiado por escribas chamados
Massoretas. Este e outros massorêticos tornaram-se as edições oficiais em que
se baseia a maioria das traduções modernas.
Os Manuscritos do Mar Morto,
a biblioteca de uma comunidade do deserto, destruída pelos romanos em 68 d.C.,
continham manuscritos mil anos mais antigos que os textos massoréticos,
incluindo fragmentos de rolos inteiros de todo livro do Antigo Testamento, com
exceção de Ester.
Entre estes tesouros
antigos, descobertos em 1947, encontra-se um pergaminho de Isaías copiado cerca
de 100 a.C., O texto hebraico, como o de outros descobertos em grutas próximas
ao mar Vermelho, revelou-se semelhante aos massoréticos – forte indicação de
que as escrituras judaicas vinham-se padronizando por volta do século I a.C, e
que escribas posteriores preservaram as palavras sagradas com extraordinário
cuidado e reverência.
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